Aluízio Marino, Junior Tan, Pedro Mendonça, Raquel Rolnik, Leonardo Foletto*

Desde o início da pandemia o LabCidade acompanha a disseminação espacial do novo coronavírus na região metropolitana de São Paulo. A partir de análises espaciais das bases de dados disponíveis associadas a pesquisas de campo, identificamos os territórios mais afetados e a complexidade de fatores que influenciam uma maior ou menor incidência da COVID-19 na escala local e metropolitana.

Já estamos entrando no terceiro ano de pandemia e continuamos lidando com a COVID-19. Não apenas com o avanço da doença, associado à nova variante ômicron, mas agora também com a antipolítica que promove dúvidas quanto à vacinação das crianças. Promovida desde que as primeiras doses foram distribuídas, ainda no início de 2021, a campanha de desinformação foi ainda mais intensa para desacreditar a segurança da vacina para as crianças brasileiras. Exemplos dessa antipolítica estão de cartazes espalhados nas ruas com supostas doenças graves que as vacinas causam até a exploração política pelo governo federal da morte de uma criança de parada cardíaca após ter recebido a vacina contra a Covid-19 – mesmo que uma investigação científica tenha apontado que o episódio não teve nada a ver com a vacina. 

Apesar das evidências que comprovam a eficácia da vacinação contra o novo coronavírus, a campanha de desinformação surtiu efeito: dados recentes mostram que somente 48% das crianças tomaram pelo menos a primeira dose no estado de São Paulo. Esse impacto é ainda maior em outros lugares do Brasil, como por exemplo o estado do Rio de Janeiro, com apenas 8,8% das crianças vacinadas – a média nacional aponta 18,8% de crianças vacinadas até 7/2/22. Além das trapalhadas logísticas, da ausência de uma coordenação nacional que garantisse maior quantidade de vacinas, ainda insuficientes, a baixa procura pela vacinação das crianças também está relacionada a um sentimento de insegurança, provocado pela mentira e pela desinformação.

Esse quadro fica ainda mais preocupante quando observamos a curva de crescimento no número de hospitalizações por COVID-19 no gráfico abaixo, que mostra o total de hospitalizações dentro de cada faixa etária na região metropolitana de São Paulo, acumulados a cada 15 dias. Ao olhar para os períodos de acentuada queda das hospitalizações, julho e agosto de 2021, vemos que as datas coincidem com o avanço da vacinação seguindo as faixas etárias. Com estes dados, mais uma vez fica evidente como a vacinação tem sido fundamental para diminuir a incidência de hospitalizações de pessoas pela COVID-19.

Porém, esse gráfico não permite uma visualização precisa sobre o impacto da COVID-19 nas menores faixas etárias - que tiveram ao longo da pandemia uma quantidade bem menor de hospitalizações e óbitos em números absolutos. Representamos abaixo estas mesmas curvas como se tivessem tamanhos equivalentes, de modo que possam ser comparadas. Este gráfico revela como o número de hospitalizações nos mais novos (0 a 12 anos), mesmo que inferiores às demais faixas etárias, se manteve constante quando comparado com as outras, que caíram drasticamente pelo menos a partir do fim de maio de 2021. Observamos também que a queda consistente das hospitalizações na população adulta coincide com o avanço da vacinação, como já mencionamos, a partir do início de julho de 2021. Porém, esta queda foi menos pronunciada nas crianças de 0 a 12 anos, o que nos indica que, apesar do avanço nas taxas de vacinação dos adultos, crianças continuaram vulneráveis à COVID-19 como no início da pandemia.

Cabe destacar que estes dados se referem somente aos casos mais graves, que necessitaram de hospitalização e  não ao total de casos de COVID-19. Isso acontece, em boa medida, pelo fato de não haver política de testagem em massa no Brasil. Por outro lado, não podemos deixar de notar que as curvas de hospitalização reforçam o impacto positivo da vacina na diminuição de casos graves, já que é visível a diminuição das curvas nas faixas etárias com o ciclo de imunização completo. 

Embora, na maioria dos casos, as crianças apresentem quadros de sintomas leves ou assintomáticos, durante toda a pandemia foram registradas 2.896 hospitalizações por COVID-19 em crianças de 0 a 12 anos na RMSP -  número que corresponde apenas aos casos mais graves. Também é importante lembrar que embora sem sintomas ou com sintomas leves, as crianças são vetores, portanto os dados significativos da queda de hospitalizações em São Paulo a partir do avanço da vacinação reforçam ainda mais a importância da imunização de crianças e adolescentes para controlarmos a pandemia. Infelizmente, a desinformação e a antipolítica da vacina vão na contra mão do controle e disseminação da doença. 

*Aluízio é pós-doutorando na FAU USP e pesquisador do LabCidade; Tan Tjui-Yeuw (Junior Tan) possui bacharelado em ciências biológicas e especialização em gestão integrada, pesquisador do LabCidade; Pedro é Arquiteto e Urbanista pela FAU USP e pesquisador do LabCidade; Raquel é professora na FAU USP e coordenadora do LabCidade; Leonardo é pós-doutorando na FAU USP e pesquisador do LabCidade.