Por Pedro Lima, Raquel Rolnik, Lara Giacomini e Aline Cruvinel
Concluído o segundo turno das eleições municipais de São Paulo de 2024, mais uma vez ressaltamos a importância de analisar os resultados detalhados por zona e suas nuances – mais além da informação única do vencedor por região – para construir leituras mais aprofundadas de um cenário político complexo.
O principal ponto que destacamos no segundo turno é o alto percentual de votos brancos, nulos e abstenções. Os 31,5% de abstenções dessa eleição superaram os 30,8% das eleições de 2020, realizadas em plena pandemia. Somando esse recorde histórico de abstenções aos votos brancos e nulos, ou seja, todos aqueles que não escolheram um candidato, os números chegam a 3 milhões e 600 mil eleitores ou 38,6% do eleitorado da cidade. Foram mais eleitores que não escolheram nenhum candidato do que aqueles que votaram no vencedor da disputa, Ricardo Nunes (MDB), que obteve 36,3%.
As abstenções, nulos e brancos somados estão espalhadas de forma relativamente homogênea por todas as zonas eleitorais de São Paulo. A zona com menor índice é Socorro, com 35,3% e a com maior índice é Bela Vista com 43,2%. Ou seja, um intervalo pequeno. As zonas com maior incidência de abstenções, nulos e brancos estão na área central da cidade: Bela Vista, Jardim Paulista e Santa Ifigênia, que, apesar de contíguas, têm perfis de voto diferentes. Bela Vista é onde Guilherme Boulos (PSOL) teve seu melhor desempenho nos dois turnos, Santa Ifigênia foi uma zona muito disputada entre os candidatos e Jardim Paulista registrou vitórias de Nunes em ambos os turnos, ainda que com pouco crescimento relativo do primeiro para o segundo. Se fosse um candidato, a soma das abstenções, brancos e nulos teria vencido em 42 das 57 zonas eleitorais da cidade.
As exceções se concentram em um cinturão onde Pablo Marçal (PRTB) obteve seus melhores resultados no primeiro turno, incluindo regiões mais centrais da Zona Leste e a porção leste da Zona Norte, em bairros como Mooca, Vila Prudente, Tatuapé, Vila Formosa, Vila Matilde, Vila Maria e Jardim Brasil. São áreas que historicamente concentraram os votos conservadores malufistas e recentemente, bolsonaristas. Ainda que consideráveis, as abstenções nessas zonas foram as menores da cidade, e os votos de Pablo Marçal migraram em grande parte para Ricardo Nunes no segundo turno. Essas regiões foram algumas das quais Nunes mais conquistou novos votos, em termos absolutos e relativos, e onde venceu com maiores vantagens. Ainda, o candidato do MDB conquistou muitos votos em outras regiões contíguas ao centro, onde já havia alcançado bom desempenho no primeiro turno, como Indianópolis e Santo Amaro.
Boulos também teve suas maiores conquistas de um turno para o outro em regiões onde já havia alcançado bom desempenho, especialmente na periferia sudoeste – Jardim Ângela, Valo Velho e Capão Redondo. O candidato do PSOL melhorou seus números entre o primeiro e segundo turnos na porção norte da Zona Leste. Nas disputadas zonas no entorno de Itaquera, como Cangaíba, São Miguel, Ponte Rasa e Parque do Carmo, onde Marçal venceu e e Boulos ficou em terceiro lugar no primeiro turno por margens muito apertadas, o candidato do PSOL teve algumas das suas maiores conquistas percentuais de novos votos.
Entretanto, as ordens de grandeza de novos votos conquistados são muito diferentes entre Boulos e Nunes, em porcentagem e números absolutos. Nas zonas onde mais cresceu entre os turnos, Boulos têm números próximos ou menores do que as zonas em que Nunes menos melhorou seu desempenho. As maiores conquistas do candidato do PSOL estão na ordem de 7% e 19 mil votos por zona, e as menores conquistas do candidato do MDB estão na ordem de 11% e 16 mil votos, enquanto as maiores giram em torno de 22% e 37 mil votos.
Por fim, o mapa do resultado por zona com o desempenho detalhado de todos os candidatos, ao invés da simples indicação do vencedor, mostra territórios centrais e periféricos muito disputados, como apontamos em nossa análise do primeiro turno. Estes números colocam em xeque a lógica centro-periferia, ou de anéis concêntricos, que ajudava a descrever o comportamento do voto nas últimas décadas. Com exceção do cinturão onde Nunes venceu com boa vantagem, um território “novo rico” e conservador, os mapas eleitorais mostram territórios disputados, principalmente se considerarmos o altíssimo índice de abstenções, brancos e nulos.
(*) Pedro Lima é doutorando da FAU-USP e pesquisador no LabCidade; Raquel Rolnik é professora da FAU-USP e coordenadora do LabCidade; Lara Giacomini é graduanda da FAUUSP e pesquisadora de iniciação científica no LabCidade; Aline Cruvinel é doutoranda da FAU-UFRJ e pesquisadora de iniciação científica no LabCidade.
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