Por Raquel Rolnik(*)

 

Um projeto de lei recentemente aprovado em primeira votação, apresentado pelo vereador Milton Leite, que se despede da Câmara Municipal de São Paulo após décadas de mandato, adia uma vez mais a eletrificação da frota de ônibus na cidade, que atualmente é predominantemente movida a óleo diesel.

A lei que estabeleceu a política do clima para a cidade de São Paulo, de 2009, estabeleceu metas para redução de emissão de gás de efeito estufa e outros poluentes, definindo prazos para substituição da frota a diesel por veículos movidos a outras formas de energia com menor impacto poluidor. Esta meta foi revista – e adiada! – em 2018 por outra lei (lei de 2018) que estabeleceu que até e até 2038 a frota de ônibus da cidade de São Paulo seria completamente limpa, ou seja, sem ônibus a diesel. Para isso, a lei estabeleceu um cronograma progressivo. Desde 2022, a SPTrans já proíbe a compra de novos ônibus movidos a combustíveis fósseis. Era, portanto, para estarmos caminhando firmemente rumo a esse objetivo. Porém, este novo projeto de lei propõe adiar a meta em dez anos, empurrando-a para 2050. Além disso, a nova lei flexibiliza essas metas ao definir que as empresas podem compensar a poluição comprando crédito de carbono, como se a compra de crédito de carbono fosse encarar e resolver o problema central: a necessidade imperiosa de mudar a matriz energética.

Sair do modelo de veículos movidos a combustível fóssil, bem como daqueles movidos a óleo diesel, na direção da energia limpa, tem dois fundamentos principais: reduzir a emissão de carbono e dos demais gases de efeito estufa que influem na atmosfera, provocando o aquecimento global; e por uma questão de saúde, já que a queima desses combustíveis é responsável pela poluição atmosférica que atinge os pulmões da população. O professor Paulo Saldiva, da Faculdade de Medicina da USP, que faz pesquisas nessa área há muitos anos, afirma que respirar na cidade de São Paulo equivale a fumar dois cigarros por dia! Estamos falando de um impacto direto e brutal na saúde das pessoas!

Enfrentar esta situação não depende apenas de mudar a matriz energética da frota de ônibus, mas, sobretudo, de repensar nosso sistema de mobilidade e transporte, baseado também em automóveis e caminhões. E na escala da cidade de São Paulo, apenas transportes coletivos de alta capacidade – como trens e metrôs – seriam capazes de ter um impacto mais significativo sobre a saúde, o clima e as próprias condições de circulação. Nesse sentido, o debate sobre substituição de combustíveis de forma alguma esgota o tema!!! Entretanto, eletrificar a frota de ônibus é uma medida necessária e urgente, um passo pequeno, porém importante.

A Prefeitura tem menos de 500 ônibus elétricos, de uma frota de 13.000 ônibus; e essa conta ainda inclui os 212 trólebus que ainda circulam pela cidade. A lei que previa a frota de ônibus movidos a energia limpa é de 2009 e já foi mudada em 2018. A grande justificativa para a nova mudança é que as empresas não conseguirão cumprir a meta. Simples assim, temos uma meta estabelecida por lei. Se esta não é cumprida… mudamos a lei!

 

(*) Raquel Rolnik é professora na FAUUSP e coordenadora do LabCidade.