Por Paula Freire Santoro, Pedro Lima (*)

A Operação Urbana Consorciada Água Branca é um projeto urbano na Zona Oeste de São Paulo, que está em vigor desde 1995 e passou por duas revisões: 2013 e 2021. Além dela, há outras três operações em São Paulo atualmente: Água Espraiada, Faria Lima — ambas desde os anos 1990 — e Bairros do Tamanduateí — aprovada em 2024.

Perímetro da Operação Urbana Consorciada Água Branca. Fonte: LabCidade (2024), com dados da Prefeitura de São Paulo sobre fotografia aérea do Google Earth

As operações urbanas consorciadas funcionam assim: a prefeitura delimita um perímetro e vende certificados de potencial construtivo adicional (os chamados Cepacs), que são títulos financeiros que permitem construir prédios maiores e mais altos, e que só podem ser usados na região. Os recursos arrecadados com as vendas financiam obras também neste mesmo perímetro, que são listadas em um programa de intervenções, definido por lei.

Então, as operações precisam do desenvolvimento imobiliário para executar as obras propostas. Quanto mais empreendimentos, mais recursos e mais obras. Daí vem a crítica à primeira geração delas: os programas só continham obras que privilegiam a valorização imobiliária. Foram sucesso em arrecadação e construíram principalmente obras viárias. Mas não atenderam as necessidades e expulsaram as populações mais pobres e quem já vivia nas regiões onde ocorreram. Esse foi o caso das Operações Urbanas Faria Lima e Água Espraiada, especialmente nos seus primeiros anos.

Na Água Branca foi um pouco diferente. A primeira fase da operação, iniciada em 1995, não conseguiu promover grandes transformações no território nem atrair o mercado imobiliário. Em 2013, ela foi revista, respondendo à crítica das operações urbanas que avançaram mas promovendo apenas valorização e expulsões. Incorporou em seu programa de intervenções uma meta de 5 mil atendimentos habitacionais, carimbou na lei 22% dos recursos arrecadados para habitação de interesse social e criou um grupo de gestão com participação paritária da sociedade civil. Contudo, a Operação Urbana Água Branca seguiu devagar até o começo dos anos 2020: foram vendidos pouquíssimos Cepacs e arrecadado pouco dinheiro (somente R$ 9 milhões). Nenhuma intervenção do programa de obras foi feita.

Entre os motivos para isso acontecer, está o preço dos Cepacs, que não foi atrativo para o mercado em retração na época do leilão de 2014. Ainda, o mercado imobiliário foi para os Eixos de Estruturação da Transformação Urbana e a própria prefeitura passou a apostar em instrumentos mais flexíveis, como os PIUs (Projetos de Intervenção Urbana) e as AIUs (Áreas de Intervenção Urbana), em detrimento das Operações Urbanas.

De 2010 a 2022, a densidade demográfica cresceu e houve muita dinâmica imobiliária na Água Branca. Mas os empreendimentos não compraram Cepacs, e sim outorga onerosa – outra ferramenta que permite construir mais, mas cujos recursos vão para obras previstas no programa de intervenções antigo, de 1995, e muitas delas são viárias!

Mapa da variação da densidade demográfica bruta na cidade de São Paulo (2010-2022). Em destaque a Água Branca, em tons de laranja, uma das regiões onde houve aumento da densidade no período. Fonte: LabCidade (2014) com dados do Censos de 2010 e 2022Nesse meio tempo, pouco antes da revisão de 2013, as favelas do Sapo e Aldeinha, que ficavam dentro do perímetro da operação, foram removidas e seus moradores estão até hoje sem moradia definitiva. Resultado destas dinâmicas, a Água Branca foi entre 2000 a 2010 um dos lugares que mais perdeu população negra em São Paulo, como mostra o mapa do Instituto de Referência Negra Peregum.

Mapa Embranquecimento 2000-2010. Fonte: Instituto de Referência Negra Peregum (2024), com dados dos Censos de 2000 e 2010

Mais recentemente, em 2023, foi realizado um novo leilão de Cepacs na Operação Urbana Água Branca, que arrecadou mais de R$ 200 milhões. Mas com ou sem dinheiro em caixa, nenhuma grande obra saiu do papel. Por exemplo, as obras de drenagem do Córrego Água Preta se arrastam, sem conclusão. No Subsetor A1, grande área pública localizada entre as Avenidas Marquês de São Vicente, Nicolas Boer e a Marginal Tietê, desde 2015 foram gastos R$ 5 milhões na realização de um concurso de arquitetura para um plano de urbanização (prevendo moradias, praças e equipamentos públicos) e no desenvolvimento de projetos executivos subsequentes. Ano passado foi contratada uma empresa para construir cerca de 700 moradias para as famílias do Sapo e Aldeinha, na 1ª etapa do projeto, mas a obra está devagar. Como pode ser visto na imagem a seguir, apenas limparam o terreno!

Imagens do canteiro de obras do Subsetor A1 da OUC Água Branca, em maio de 2024. Fonte: Movimento Água Branca

 

Acima, os usos atuais do Subsetor A1 e abaixo, uma perspectiva do projeto vencedor do concurso de 2015. Fonte: Prefeitura de São Paulo

Em suma, trazer à tona a Operação Urbana Água Branca no primeiro debate da corrida eleitoral para a prefeitura de São Paulo é importante, mas a questão principal não é exatamente ser a favor ou contra… É bem mais complicada!

 

(*) Paula Freire Santoro é é professora doutora da FAUUSP, coordenadora do LabCidade e bolsista produtividade CNPq 2; Pedro Lima é doutorando e pesquisador do LabCidade.