Paula Freire Santoro*

Diversas mesas e sessões livres do Enanpur 2022 mergulharão em debates sobre métodos, teorias e práticas em torno de conceitos como interseccionalidade, gêneros, sexualidades, temas em disputa no campo do urbano. Avançamos nas leituras que abordam estas categorias, muitas vezes no campo da sociologia e antropologia, e parece que não é nada tímida a presença destas abordagens nos artigos, mesas e sessões do evento, ainda com desafios muito grandes em relação à métodos, teorias e práticas nos estudos urbanos. Destacamos alguns destes momentos, de pesquisadores parceiros, ou do LabCidade, para quem se animar a compor o debate rico e instigante que se anuncia.

Na tarde de segunda, 23 de maio, 13h15, a Poliana Gonçalves Monteiro apresenta o artigo “A violência contra as mulheres e o direito à cidade”. Já comentamos aqui sobre outros trabalhos da Poliana, especialmente o artigo do dossiê RBEUR que procura compreender as violências nos estudos urbanos como uma ruptura forçada das rotinas consideradas essenciais para a produção e reprodução do capitalismo racista e patriarcal. São violências que acontecem a partir das ausências estratégicas, presença precarizada e violenta do Estado e pela presença ostensiva dos poderes paraestatais – sejam eles milícia, tráfico, ou outros regimes de controle dos “territórios da pobreza”. Usa a metáfora da “cidade em guerra” para mostrar que os efeitos da sociabilidade violenta incidem sobre as mulheres – mães solo são culpabilizadas, mulheres “tombam”, sofrem feminicídio e vivem uma rotina violenta –, mas não são visíveis aos que desenham políticas, em uma espécie de sexismo institucional. Já curiosa para ver o que ela traz na Anpur. Na mesma mesa será apresentado o artigo “Campo de Batalha: Cartografia de terreiros e os conflitos com iigrejas neopentecostais em São Gonçalo e Niterói” da Fernanda Mello Alves, orientanda da Fernanda Sanchez (UFF).

Na manhã da terça-feira, 24 de maio, às 10h30, na Sessão Especial – A RBEUR e o campo dos estudos urbanos e regionais quando apresentamos alguns destes desafios que resultaram no dossiê especial “Território, Gênero e Interseccionalidades” da Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionais, recém organizado por Paula Santoro, Rossana Tavares, Gabriela Leandro Pereira e Diana Helene. Um podcast recente trabalha alguns dos temas da Revista, inspirado no editorial do dossiê.

Ainda na terça, 24 de maio, às 13h15, vários artigos da mesa giram em torno de abordagens interseccionais, desde sujeitos periféricos, casas de referência da mulher, perspectivas feministas nos movimetnos de moradia, indígenas, a cidade-armário e o urbano na formação de subjetividades sexuais, entre outras. Nela, o pesquisador Miguel Mermejo apresenta artigo resultado de sua pesquisa sobre o “Largo do Arouche: uma trama de disputas. Lócus de transformação urbana e resistência LGBTQIA+”, orientada pela profa. Paula Santoro (FAUUSP). O trabalho procura refletir em torno das práticas de planejamento urbano frente ao desafio de reconhecer e fomentar territórios identitários delimitados por subjetividades. Visita o recente projeto público a la “Petit Paris” proposto para o Largo do Arouche, os debates, embates e resistências, a judicialização, sobre um território em transformação também pelo mercado imobiliário. A mesa também envolve estudos sobre as práticas comunitárias dos community land trusts, apresentadas pelo Dario Tognato e Martim Furtado. 

Na tarde de terça, 24 de maio, às 17h15, Vilma Silva, Henrique Cunha e Fábio Velame debatem na sessão livre “Bairros negros: a forma urbana das populações negras no Brasil”. Fábio é um professor com trajetórias acadêmicas e profissionais que se entrelaçaram, alimentadas pela militância negra no estado da Bahia. Esta é uma das sessões que ele está.

Final da tarde de terça, 24 de maio, às 19h15, Carolina Alvim de Oliveira Freitas lança o livro resultado de seu mestrado na FAUUSP, intitulado “Mulheres e periferias como fronteiras: o tempo-espaço das moradoras do Conjunto Habitacional José Bonifácio”. O livro também está disponível em formato aberto.

Começo da noite de terça, 24 de maio, às 19h45, acontece a sessão livre “Os gêneros e as sexualidades dissidentes na cidade”, organizada por Eduardo Rocha e Clevio Rabelo, com Diana Helene e Paula Santoro. Nela reconhecemos os vínculos afetivos construídos em torno do compartilhamento de gêneros e de sexualidades dissidentes, recriando novos espaços na cidade. A mesa pretende debater como os marcadores gênero e sexualidade atuam como uma forma de dissidência deliberada nos usos das arquiteturas e na experiência da cidade. “Amor, luta, fervo, violência e estigma” são elementos centrais da caracterização tanto da história dos lugares quanto de sua vivência atual e suas possibilidades de transformação no futuro. 

Na quarta, 25 de maio, às 17h15, entra em pauta uma crítica na forma de ler, analisar e planejar as cidades. A sessão livre “Possibilidades metodológicas de ensino, pesquisa e extensão em planejamento urbano e regional: debates interseccionais e decoloniais” traz a necessidade de superar os planos e projetos funcionalistas do modernismo e sua ideia de neutralidade, do sujeito universal que na realidade é o homem branco europeu, sem enxergar os diferentes corpos. Parte desta crítica para realizar um debate sobre epistemologias no campo do planejamento urbano e regional, apostando na experimentação teórica e teórico-prática para a construção de epistemes que deem conta das questões contemporâneas da sociedade, especialmente latino-americana. Diana Helene, Maria Andreotti, Kaya Lazarini revisitam concepções em torno da memória e epistemes feministas, e trabalhos que trazem exemplos do planejamento urbano que sublinham e apontam novos sujeitos e práticas de valorização das memórias e expressão de grupos historicamente subordinados, como mulheres, negros, indígenas e homo/bi/transexuais. Rossana Tavares “encorpora” outras perspectivas epistemológicas – abordagens que colocam no centro, de forma interseccional, os corpos e a vida cotidiana – a partir das teorias feministas, trazendo experiências de pesquisa, militância e disciplinas da graduação e pós. Lazana Guizzo compartilha uma experiência de ateliê de projeto. E Flavia de Souza Araújo traz a implantação de um novo projeto pedagógico de um curso de arquitetura. 

Neste mesmo dia e horário (pois é…), 25 de maio, 17h15, Fábio Velame, Andreia Moassab, Gabriel Cunha e Ana Barone debatem na sessão livre “Relações étnico-raciais e cidade 1: cidades afro-diaspóricas”. Às 19h45, a sessão continua, sob o número 2, com Joana D’Arc de Oliveira, Maria Penha, Carlos Lima.

Ainda na quarta, 25 de maio, às 19h15, Ana Barone, Geuson Pinheiro e Maria Gabriela Feitosa apresentam o artigo “Samba e cidade”. Ana Barone coordena o LabRaça da FAUUSP,  e organizou, com Flavia Rios, a coletânea “Negros nas Cidades Brasileiras” (editora Intermeios, 2018).   

E 25 de maio, quarta, 19h30, a sessão “Segregação racial nas cidades brasileiras” com Ana Barone, Inaiá Carvalho, Danilo França e Renato Emerson dos Santos, reúne vários e conhecidos pesquisadores do tema. Danilo França vem de uma tese (2010) que recuperou, através de métodos quantitativos, a observação da segregação em São Paulo, quem mora perto de quem, distinguindo por raça e classe. Renato Emerson é geógrafo, autor do livro “Diversidade, espaço e relações étnico-raciais: O negro na geografia do Brasil”, professor que recentemente ministrou aula num curso integrado de pós-graduação, sobre as questões étnico-racias e as cidades, disponível no youtube do LabCidade.

Paralelamente, também 25 de maio, quarta, 19h30, acontece a sessão livre “Visões insurgentes sobre os territórios – investigações feministas na pandemia”, com várias pesquisadoras cariocas, inclusive Rossana Tavares, Poliana Monteiro, já citadas, entre outras, como Mariana Cardoso Pena, que recém defendeu o mestrado sobre a experiência feminina nos estádios de futebol. 

Nos encontramos virtualmente nestes debates!

Ainda, vários outros trabalhos que parecem se relacionar com os temas acima abordados, alguns deles listamos a seguir, exemplificando como os temas parecem estar circulando no encontro:

23 mai, 8h15. (550) A utopia do direito à cidade: Apropriação do espaço urbano pelas mulheres. 

23 mai, 17h15. (718) A cidade sob a ótica do afeto: registros visuais, sonoros e discursivos do cotidiano.

23 mai, 19h45. (540) Cidades africanas 01: Ausências e emergências na diáspora, espaços, territórios e sociedades.

24 mai, 13h15. (276) Gênero, colonialidade e direito à cidade. 

24 mai, 13h15. (975) Na política de rua dá pra fazer história, mano. Contribuições para o debate sobre a presença negra nos monumentos históricos da cidade de São Paulo.

24 mai, 13h15. (235) A memória feminina em Juiz de Fora e o eco de liberdade de Rosa Cabinda.

24 mai, 13h15. (914) Perspectivas femininas e feministas: A construção de comuns urbanos nos movimentos de moradia na Zona Leste de São Paulo.

24 mai, 13h15. (443) Vida e mobilização Indígena face às disputas territoriais: o caso da Terra Indígena Ibirama-LaKlãnõ, Santa Catarina, Brasil.

24 mai, 13h15. (726) Cidade-armário: o espaço urbano na formação de subjetividades sexuais.

24 mai, 13h15. (685) Encarcerados territorialmente: Os conflitos ambientais territoriais do quilombo de São Roque. 

24 mai, 17h15. (308) Imigrantes internacionais e o espaço urbano. Acolhida de indígenas imigrantes internacionais em cidades: o desafio da integração culturalmente sensível.

24 mai, 8h15. (561) Cidades inclusivas para as mulheres: o papel do Conselho de Arquitetura Urbanismo em pugnar pelo direito às mulheres à cidade.

25 mai, 8h15. (878) Mulheres e o direito à cidade: análise cartográfica e interseccional da rede de apoio às mulheres vítimas de violência em Porto Alegre/RS.

25 mai, 8h15. (342) Negros e negras no desenvolvimento local de Blumenau: invisibilidade ou inexistência? Eis a questão!

25 mai, 8h15. (530) Os quilombos do Ribeira e a preservação ambiental. 

25 mai, 13h15. (487) Os impactos do programa habitacional Morar Feliz em Campos do Goytacazes/RJ no cotidiano de mulheres empobrecidas chefes de família monoparental.

25 mai, 13h15. (774) Os limites para o Direito à Cidade das mulheres no Brasil: uma problematização da política urbana brasileira a partir das desigualdades de gênero. 

25 mai, 13h15. (452) Ruas que revelam histórias: trajetória das zonas de prostituição na cidade do Rio de Janeiro.

25 mai, 13h15. (956) Territórios Negros em Porto Alegre: Toponímia da emancipação negra no mapa de 1888.

25 mai, 13h15. (253) Tradições, festas e lazer: Impulsionando o turismo de experiência afrocentrado em territórios afro-identitários na cidade do Rio de Janeiro.

25 mai, 19h45. (491) Cidades africadas 02: ausências e emergências na diáspora, corpos, sujeitos e lutas.

26 mai, 8h15. (778) Potencialização do uso da bicicleta por mulheres utilizando tecnologias em rede na Cidade Senciente.

26 ma, 13h15. (611) Vivências LGBTQIAP+ na São Paulo Contemporânea: um olhar sobre o Itaim Paulista e São Miguel Paulista.

*Professora da FAU-USP e coordenadora do LabCidade