Atratividade da plataforma pode ser reduzida em função da crescente regulação por parte das prefeituras
Por Raquel Rolnik *
Nascido sob a égide da economia do compartilhamento (sharing economy), e apostando na utopia de uma nova forma de consumo, coletiva e consciente, na qual as pessoas oferecem um espaço físico vazio ou subutilizado de suas casas para outras pessoas conhecerem outras cidades vivendo como seus residentes, em suas residências, o Airbnb está se transformando em grande negócio e literalmente tomando o mercado residencial de aluguel, especialmente em cidades que atraem grande quantidade de turistas.
Isso começa a acontecer também no Brasil. Que é, aliás, é o 13º país mais visitado, dentre os 191 em que o Airbnb está presente. Em 2018, de acordo com Leonardo Tristão, executivo da corporação, em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, a plataforma registrou 3,7 milhões de hospedagens, alta de 640% na comparação com 2016, ano em que Brasil sediou os Jogos Olímpicos.
Para Bianca Tavolari, em artigo para o LabCidade, é a flexibilidade para gerenciar contratos de curto prazo e a ausência de regulação específica que têm atraído cada vez mais estas empresas que controlam centenas e, em alguns casos, milhares de imóveis. Em São Paulo mesmo, afirma ela, que é professora do Insper e do Núcleo Direito e Democracia da Cebrap, há inclusive empresas construindo imóveis especificamente para o Airbnb.
“Se comparado com a locação residencial de longo prazo, o Airbnb se mostra muito mais dinâmico. É possível definir o número de dias de hospedagem, cobrar mais caro em feriados e em temporadas de maior procura e até mesmo recusar hospedagem a qualquer momento. Já a ausência de regulação específica faz com que estes usuários comerciais não paguem os impostos cobrados da rede hoteleira ou das imobiliárias.”
É por isso que cada vez menos quem oferta é uma pessoa que compartilha um quarto vazio em sua casa. O aluguel via plataformas digitais permite driblar todo tipo de taxação sobre atividade econômica e regulação dos aluguéis de imóveis.
Em localidades como Barcelona, Paris ou Nova Iorque, isso tem efeitos sobre o próprio mercado de locação residencial, na medida em que parte importante do estoque atual acaba sendo retirado do mercado de aluguel para virar destino do Airbnb ou de empresas similares. O efeito é a diminuição drástica da oferta e a elevação estratosférica dos preços dos aluguéis, o que acaba gerando uma crise que reverbera na agenda pública.
O que temos observado é um movimento de enfrentamento das cidades à própria plataforma, através da introdução de controles e regulação da atividade. A primeira delas é a exigência, pelas prefeituras, de registro do imóvel como passível de aluguel via Airbnb. É o caso de Los Angeles, que exige pagamento de taxa anual – e que, como Nova Iorque, proíbe o registro de mais de um imóvel por usuário.
As cidades têm limitado também o número de dias que um imóvel pode ser alugado através da plataforma: em Amsterdam são no máximo 60 pernoites por ano (que serão reduzidas a 30 até o final do ano), e em Paris e Nova Iorque o teto é de 120 pernoites. Outras prefeituras têm introduzido a obrigatoriedade de pagamento de taxas diárias, as mesmas pagas por hotéis. E em Santa Monica, na Califórnia, onde o Airbnb enfrenta uma das regulações mais restritivas, a taxa que incide sobre o serviço é de 14%. Além disso o morador tem não apenas que registrar sua atividade como um negócio, mas também precisa provar que continua vivendo no imóvel.
Cidades como Barcelona também estão limitando as zonas nas quais este tipo de atividade é permitida. Depois do registro obrigatório, passou a adotar, e isso a partir de 2014, uma espécie de moratória de novos registros, além de fiscalizar e impor multas aos proprietários ilegais e à própria plataforma, obrigando-a a remover mais de 2.600 apartamentos de sua carteira de ofertas de hospedagem.
Enfim, este é um tema quente, que tende a crescer. E o caminho provável é que no Brasil também as cidades introduzam regulação sobre o tema. Em esfera federal chegou a tramitar no Senado o Projeto de Lei 748/15, cuja proposta era alterar a Lei do Inquilinato (nº 8.245/91) para atualizar o regime de locação por temporada, incluindo nesta modalidade os imóveis ofertados em plataformas online. Embora o texto tenha caducado, as municipalidades têm se mobilizado. Caldas Novas, em Goiás, foi a primeira a aprovar uma legislação específica. E como ela, outras, como Ubatuba e o Rio de Janeiro, seguem o mesmo caminho. Parece que é questão de tempo até que novos limites sejam impostos à atividade dessas corporações.
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