Foto: Rede Brasil Atual

Edição 2019 da pesquisa sobre mobilidade na cidade de São Paulo apresenta dados importantes a serem levados em consideração neste momento em que a Prefeitura anuncia a  assinatura de novos contratos de concessão de ônibus. 

Por Raquel Rolnik*

Fruto de uma parceria entre a Rede Nossa São Paulo e o IBOPE Cidades, e com o apoio do MobCidades, a edição 2019 da pesquisa Viver em São Paulo revela que, nestes tempos de desemprego e crise, o preço da tarifa é a razão pela qual 71% dos usuários de ônibus, 57% deles mulheres, negros e negras (57%), com renda familiar de até 2,5 salários mínimos (46%), deixam de fazer alguma atividade pela cidade, dentre as quais visitar parentes (50%), realizar atividades culturais (45%) ou consultas médicas e exames (40%), procurar emprego (37%) e ir à escola ou universidade (24%).

Investigando a percepção dos paulistanos em relação à mobilidade urbana, a pesquisa, que entrevistou 800 pessoas distribuídas entre diferentes regiões da cidade, extratos de renda, gênero, idade e escolaridade aponta redução do tempo médio diário do deslocamento principal na cidade, que recuou 10 minutos na comparação com o ano passado, e atualmente é de uma hora e 47 minutos. Isso tem a ver com a maior oferta de transporte coletivo e integração entre trens e trens-metrô-ônibus, que implica num melhor desempenho da rede.

Entretanto, mais da metade das pessoas entrevistadas (58%) gastam até 2 horas por dia em deslocamento para realizar a sua atividade principal e 21% gastam entre duas a mais de quatro horas. Estes são tempos que também estão presentes nos deslocamentos por automóvel, o que contribui para justificar o apoio da maioria dos entrevistados, inclusive entre os proprietários de carros, à medidas que priorizam o transporte coletivo, como os corredores de ônibus.

O ônibus (47%) continua sendo o transporte coletivo utilizado com mais frequência pela população, seguido do carro (20%), metrô (12%), a pé (6%, maior patamar desde 2015), transporte particular como Uber, 99 Pop e outros (5%), trem (4%), bicicleta (2%), ônibus intermunicipal (1%) e motocicleta (1%).

Mas, na comparação com as edições passadas da pesquisa, cresceram as queixas em relação à pontualidade, superlotação, além das mudanças nas condições de uso do vale-transporte. A principal queixa, superlotação, é citada por 19% dos entrevistados, seguido do preço da tarifa, frequência e pontualidade. Em média espera-se 21 minutos no ponto, mas 45% das pessoas esperam entre 15 a 45 minutos e 9% delas por tempos que variam entre 45 a 60 minutos.

Entre as pessoas que não utilizam o ônibus, ou restringem seu uso a até dois dias por semana, a lotação ainda é o principal motivo para a não utilização (34%), seguida pela demora do trajeto (31%), o uso do carro (25%) e a tarifa (cuja menção cresceu de 14% em 2017 para 16% em 2018 e 20% em 2019).

O que a pesquisa mostra é que a melhoria do sistema de ônibus, inclusive seu acesso mais amplo, hoje bloqueado pelo valor da tarifa, tem papel central no sistema de mobilidade dos paulistanos. Por outro lado, a Prefeitura está exatamente neste momento anunciando a assinatura dos novos contratos de concessão do sistema, por 15 anos, sem que esteja claro de que forma estas questões, sentidas pelos paulistanos no dia a dia e apontadas na pesquisa, serão equacionadas.

Pior: como a Câmara Municipal resolveu que os contratos teriam 15 anos (e não 10, como desejava a Prefeitura), isto implicou em mudanças nos termos dos contratos, que não foram até agora publicizadas de forma a poder ser avaliada pelos moradores. Sobram dúvidas sobre o novo desenho da rede, a permanência ou não de linhas, entre outras. É urgente que os termos destas contratação sejam publicizados e incorporem as garantias para que estes, e vários outros aspectos, possam de fato melhorar.

* Professora da FAU-USP, coordenadora do LabCidade. Coluna originalmente publicada no UOL.