A Favela do Coliseu existe há quase 60 anos | Foto: Paloma Vasconcelos/Ponte Jornalismo

O Observatório de Remoções atualiza trimestralmente o mapeamento colaborativo das remoções e ameaças de remoção na Região Metropolitana de São Paulo.  No trimestre de janeiro a março de 2020 observamos um número pequeno de remoções, assim como a atualização anterior, divulgada em janeiro, que aponta o ano de 2019 com um número menor de remoções quando comparado com os dois últimos anos (2017 e 2018).

O primeiro trimestre de 2020 contabiliza três casos de remoção, todos em janeiro. Ao menos 245 famílias foram removidas. Duas dessas remoções foram motivadas por obras públicas, ambas na zona oeste de São Paulo: a Favela Boca do Rato, removida parcialmente em função  das obras do Programa Marginal Segura; e a Favela do Funchal (Favela do Coliseu), removida em sua totalidade para a construção de 272 unidades de habitação de interesse social, mas que gerou tensões em função de possíveis moradores  que não serão atendidos no novo projeto e assim moradores relataram que nas vésperas da reintegração de posse a comunidade foi alvo de ações policiais violentas. Há ainda mais um caso de remoção em São Bernardo, no Acampamento dos Engenheiros, comunidade que é alvo constante de remoções administrativas parciais.

Foram mapeadas vinte e três novas ameaças de remoção, que impactam cerca de cinco mil famílias. A maior parte é alvo de processos de reintegração de posse, correspondendo a sete dos dez novos casos. Duas ameaças estão relacionadas a PPP Casa da Família, uma parceria público privada para construção de habitação no município de São Paulo. A parceria acontece desde 2018 e, em janeiro de 2020 lançou um novo edital de contratação que incide sobre áreas ocupadas e não prevê o atendimento habitacional destas,  afetando aproximadamente 1400 famílias.

Também foram identificadas e incorporadas ao mapeamento oito remoções anteriores ao período dessa atualização, que impactaram pelo menos 3.000 famílias. Duas delas ocorreram em 2018, cinco em 2019. A inserção de informações retroativas é importante para que, mesmo já concluídas estas ações sejam visibilizadas. O desafio de registrar estes dados é permanente.

Em março, essa problemática estrutural da precariedade e insegurança habitacional ganhou novos desenhos em São Paulo, quando a situação de calamidade da saúde pública provocada pela pandemia do novo coronavírus colocou toda a sociedade em situação de isolamento. Um quadro onde as condições desiguais de moradia na metrópole influenciam diretamente nas possibilidades de proteção e enfrentamento ao vírus.

Desde março quando os primeiros casos do covid-19 foram identificados na cidade, nenhum  novo processo de remoção ou ameaça de remoção foram identificados. Isso se deve também às articulações e recomendações elaboradas por diferentes entidades e instituições, como o ministério público e a  defensoria pública.

Entretanto uma “trégua” nas remoções, fundamental no momento de pandemia, não significa o fim da insegurança  habitacional. Um exemplo disso é a ameaça de corte do auxílio aluguel de  5700 famílias na cidade de São Paulo, que foram removidas em função das obras públicas municipais e estaduais ; bem como as centenas de milhares de famílias que, com a perda de rendimentos decorrente dos impactos do novo coronavírus na economia, correm ainda mais o risco do despejo por falta de pagamento de aluguel. Muitas dessas famílias foram, muito provavelmente, despejadas ou removidas anteriormente, permanecendo sob a condição de transitoriedade permanente.

Os impactos sociais e econômicos da pandemia nas cidades brasileiras exigem  a suspensão imediata dos processos de remoção forçada, caso contrário milhares de pessoas ficarão em uma situação de maior vulnerabilidade. Ao mesmo tempo escancara a urgência de políticas públicas que garantam a segurança habitacional e o acesso a moradia de qualidade para às famílias brasileiras.