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Foto: Vitor Nisida

 

*Por Anaí Rodrigues

Uma cidade que quer, de fato, enfrentar o problema da exclusão territorial, não pode admitir o mau uso da terra. Assim, o controle do uso do solo possui um papel central em qualquer política pública relacionada à provisão habitacional de interesse social.

Nesse sentido, o Plano Diretor Estratégico, aprovado no dia 30 de junho, avançou bastante ao trazer de forma mais concreta os instrumentos de indução da função social da propriedade. Tais avanços podem ser resumidos em quatro tópicos:

1) Auto-aplicabilidade. O novo plano traz de forma bastante detalhada o procedimento a ser observado para implementar os instrumentos. Assim, não são necessárias novas leis que regulamentem a sua utilização, que podem – e devem – ser desde já aplicados. Além disso, essa incorporação traz maior segurança ao procedimento, já que o Plano Diretor, que vale por 15 anos, é uma legislação “mais estável” do que uma lei que viesse a regulamentá-lo.

2) Obrigações concretas, responsáveis e prazos são indicados para cada uma das etapas do procedimento, que não depende mais da vontade do gestor público. Pelo contrário, o plano estabelece tanto os prazos que devem ser observados pelos proprietários para parcelar, edificar ou utilizar o imóvel, como a obrigação da Prefeitura de adotar as medidas previstas em caso de inércia daqueles, indicando responsáveis (em especial a Coordenadoria de Controle da Função Social da Propriedade). Por exemplo, o parágrafo 2º do artigo 99 estabelece o prazo de um ano para publicação de decreto para desapropriação de terreno, findo o prazo de cinco anos de aplicação de IPTU progressivo.

3) Imóveis não utilizados e subutilizados “entram na roda”. Com o novo plano, esses imóveis (definidos nos artigos 94 e 95) são efetivamente incluídos dentre aqueles a serem alvo da fiscalização pelo Poder Público – o que não ocorria até então, já que a Lei 15.234/10, única referência concreta na implementação dos instrumentos na capital, tratava apenas de imóveis não edificados. Ou seja, os prédios vazios do centro, por exemplo, continuavam a não sofrer qualquer tipo de fiscalização, em que pese a previsão genérica para isso desde o plano anterior.

4) Transparência e participação. Por fim, e talvez mais importante, o novo PDE cria mecanismos de controle e participação no procedimento de fiscalização do uso da propriedade, ao estabelecer que seja disponibilizada ao público, para consulta, a listagem dos imóveis cujos proprietários foram notificados e informações gerais sobre o procedimento (art. 100) – uma primeira versão dessa lista deve ser publicada seis meses após a promulgação do plano.

Além disso, a principal justificativa da Prefeitura para a não implementação dos instrumentos até hoje (a partir da edição da Lei 15.234/10, já que antes disso era a ausência de regulamentação) é a de que não possui estrutura para localizar os imóveis não edificados. Nesse sentido, o novo plano traz uma inovação interessante ao prever um mecanismo pelo qual qualquer pessoa (física ou jurídica) pode indicar imóveis para serem fiscalizados (art. 101). É interessante porque, de um lado, isso ajuda a Prefeitura a identificar os imóveis e, de outro, porque permite que a população se envolva também, participando do processo de controle do uso do solo da sua cidade.

*Anaí Rodrigues é defensoria pública do Estado de São Paulo e contribuiu com o Movimento pelo Direito à Cidade no Plano Diretor durante seu processo de revisão.