Ocupação Nova Palestina Foto: LabCidade

 

Nesta quarta-feira, dia 7 de novembro, uma equipe da Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (CIDH/OEA), coordenada pela comissária Esmeralda Arosemena, visitou a área conhecida como Cracolândia, no centro de São Paulo, e a ocupação Nova Palestina, do MTST, no extremo sul da cidade. As visitas foram acompanhadas por pesquisadores do LabCidade FAUUSP e do Observatório de Remoções.

A delegação da OEA está com equipes espalhadas por Brasília e pelos estados da Bahia, Maranhão, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Pará, Rio de Janeiro, Roraima e São Paulo. O trabalho no país será encerrado com uma coletiva de imprensa no dia 12 de novembro, no Rio de Janeiro, onde serão divulgadas as principais observações acerca do trabalho realizado no Brasil.

Esmeralda Arosemena (CIDH/OEA) Foto: LabCidade

Cracolândia

No centro de São Paulo, a equipe da CIDH foi conduzida por um trajeto pelo “fluxo”, área onde se concentram usuários de drogas, sob coordenação da organização É de Lei. A comissária Esmeralda Arosemena disse considerar a situação aterradora para a humanidade, pela extrema vulnerabilidade em que os indivíduos se encontram. Ela disse ser crucial considerar o caso como uma questão de saúde pública. A equipe visitou também um dos Atendes da região, que é um posto de atendimento aos usuários administrado pela prefeitura.

No Teatro de Contêiner, também na região da Luz, a comissária conversou com a imprensa, com alguns usuários e moradores do bairro e com representantes de movimentos sociais. Nos relatos, foi denunciada a excessiva e arbitrária violência policial, com casos frequentes de agressões e violações de direitos humanos, como a apreensão de celulares de moradores e ativistas que registraram violências, com a exigência de que o conteúdo fosse deletado.

Também foi criticada a descontinuação do programa De Braços Abertos, o fechamento de hotéis sociais, onde usuários podiam passar a noite em segurança, e a extinção dos postos de trabalho que eram ofertados pelo programa. Foi recorrente também nas denúncias a limitação do direito de ir e vir, devido às barreiras colocadas pelo poder público na rua, tanto físicas, na forma de tapumes, quanto pela frequente abordagem policial.

Moradores denunciaram as graves violações do direito à moradia, com a remoção de famílias de suas casas e com a demolição e emparedamento de prédios. Uma moradora de uma ocupação na região afirmou que vive com medo do que pode acontecer, “medo de chegar em casa e o prédio simplesmente não estar mais lá”. Foi criticada a ação da prefeitura e do governo do Estado, que remove as famílias sem oferecer alternativa habitacional, e a promoção da PPP Habitacional, que está sendo erguida no bairro, sem que os moradores do bairro sejam contemplados com unidades.

Ocupação Nova Palestina Foto: LabCidade

Nova Palestina

Em visita a ocupação Nova Palestina, as relatoras da CIDH conheceram duas casas e conversaram com as famílias. Após a visita às casas, aconteceu uma reunião com a presença dos moradores, lideranças da ocupação (MTST), lideranças e representantes de outros movimentos sociais, jornalistas, conselheiras tutelares e pesquisadores do Observatório de Remoções.

Integrantes do MTST destacaram a importância da visita da comissão, devido à conjuntura política atual, onde o próprio movimento é enquadrado como terrorista. Está em curso uma agenda de criminalização dos movimentos sociais e de esvaziamento das políticas sociais, inclusive as de moradia.

Para a Central de Movimentos Populares (CMP), foi fundamental alertar, na presença da comissão, para a necessidade de garantir o direito de manifestação e a luta pelos diretos humanos. Os defensores dos direitos humanos vêm sofrendo graves ameaças e violências. O Centro Gaspar Garcia de Direitos Humanos ressalta que o momento é delicado, com sensível avanço da criminalização e perseguição de lideranças, com impacto direito no próprio trabalho dos advogados, cujas prerrogativas não estão sendo respeitadas.

Uma representante da Ocupação Rio Branco denunciou, no encontro, que a luz da ocupação foi cortada recentemente, Após as vistorias realizadas pela prefeitura este ano, após o desabamento do edifício Wilton Paes de Almeida, no Largo do Paissandu, foi considerado que a ocupação está em situação de risco. As famílias estão, portanto, ameaçadas de remoção, vivendo em condição precária e sem nenhuma posição referente a um atendimento habitacional.

Conselheiras tutelares de São Bernardo do Campo relataram o aumento de pedidos de reintegração de posse na região. Desde julho deste ano, acompanham 15 casos onde houve violações de direitos. Há relatos de remoções que aconteceram no período da noite, com máquinas passando por cima de móveis e de casas com todos os objetos pessoais dentro.

Para a Confederação Nacional das Associações de Moradores, a conjuntura é explosiva: há diminuição de investimentos sociais, crise política e fiscal, criminalização dos movimentos e agenda de privatização, que coloca em risco direitos sociais.

Lideranças da ocupação Nova Palestina destacaram que a violência policial nos territórios periféricos piorou nos últimos meses, e que as comunidades muitas vezes não têm para quem denunciar as agressões. O discurso violento contra a esquerda e contra movimentos sociais está legitimando uma série de violências. “Estamos correndo risco de vida”, afirmou.

No encontro, o Observatório de Remoções apresentou dados atualizados sobre as remoções e ameaças de remoção.

Ocupação Nova Palestina Foto: LabCidade

A comissária Esmeralda Arosemena destacou o sentimento de comunidade que percebeu durante a visita. Bem como a fortaleza das mulheres que conheceu, exaltou a importância de que continuem exigindo seu direito à moradia adequada. Ela destaca o papel da comissão de relatar as violações de direitos humanos ao Estado Brasileiro e a organizações multilaterais. Todos os relatos serão transmitidos a partir de um relatório da comissão. Arosemena ressaltou a importância de adotar medidas cautelares, que podem ser solicitadas à comissão, em situações de extrema urgência, onde houver risco para as pessoas.

Após o encerramento da visita da comissão ao Brasil, será elaborado um relatório preliminar sobre vulnerabilidade e exclusão no país e, num segundo momento, será realizada uma análise mais completa, de onde sairão recomendações ao Estado Brasileiro, além de um informe completo, com casos específicos que ilustram as violações de direitos humanos observadas durante a visita.

A CIDH está aberta para receber materiais que ajudem a aprofundar a questão e a subsidiar os trabalhos. A comissão também informou que a REDESCA funciona como um observatório sobre direitos fundamentais, e que o órgão está acompanhando casos de violações de direitos no Brasil.